quarta-feira, julho 11, 2007

O Continente Desconhecido

6ª feira, 6 de Julho, Aeroporto da Portela. Estou parado em frente à porta de saída dos passageiros que chegam de avião a Lisboa. Seguro uma folha de papel A3 com a inscrição "Salimova Zarina" e viro-a na direcção de todos os que saem por essa porta. Enquanto que a maioria das pessoas se dirige para casa no final de mais uma semana de trabalho, eu estou de serviço para o NAPE. Objectivo: esperar uma jovem do Cazaquistão que vem estagir para Portugal ao abrigo do protocolo IAESTE e levá-la à estação do Oriente de onde apanhará um comboio com destino a Aveiro. São 19:14 quando chego ao terminal. Os avisos da ANA indicam que o vôo 7B401 da KasAir proveniente de Moscovo aterrará pelas 19:17. Normal... apenas 7 minutos de atraso. Enquanto espero, olho em redor. Uma variedade de pessoas está também à espera de alguém: agentes turísticos à espera de excursões, pais à espera dos filhos que foram a uma viagem de finalistas, familiares à espera de familiares... E no meio deste corropio algo me faz parar, algo me faz olhar no horizonte criado por este cenário, algo me faz perder nas profundezas dos meus pensamentos.
Tenho 25 anos, 2 meses e 19 dias de vida. E que vida é esta? Será que tem valido a pena viver? Interrogo-me qual o propósito pelo qual naquela manhã de Abril de 1982 eu decidi vir ao mundo um mês antes do que estava previsto. Valeu a pena?
Ao longo deste tempo todo tenho seguido vários caminhos, tomado várias opções, feito escolhas, algumas delas sensatamente, outras nem por isso. Quase todas pensadas mas muitas ainda por instinto. Que ganhei eu com isso? Certamente ganhei mais do que perdi, pois nada é dado como garantido e nem sempre corre como queremos. A escolha pelo caminho mais duro, mais trabalhoso foi aquela que me ensinaram desde pequeno a seguir pois é por esta via que se provam valores como a honestidade e a sinceridade e se ganha respeito. Mas agora, olhando para trás, será que valeu a pena? Ganhei mais por isso? Olhando em comparação com os que me são próximos, apresento alguma vantagem ou, pelo menos, estou em pé de igualdade. Temos o mesmo? Claramente, não. E isso faz-me pensar se tenho agido correctamente... É verdade que tenho uma família adorável, é verdade que tenho amigos com quem posso contar em qualquer altura. Mas será que é tudo? Será que não falta nada? Será suficiente? Porque vivemos num lugar onde os comportamentos indiciam que "se é assim com um, também é assim com os outros"? Nós não somos todos iguais, nem tudo corre por igual a todos... E isso é que me leva a questionar se tenho escolhido bem. Afinal de contas, para quê me preocupar em fazer da hard way quando posso fazer pela easy way? É mais fácil dizer não que dizer sim, é mais fácil destruir que criar, é mais fácil desagradar que agradar e... é mais fácil terminar uma vida que criar uma. Faça eu o que fizer, ganho rigorosamente o mesmo e é a minha maneira de ser que me impede de seguir a via errada, que me impede de perder o pouco que já ganhei...
No Hamlet é feita a referência ao "continente desconhecido". Nesta obra de Shakespeare, o continente desconhecido é a morte, para onde se viaja sem se saber o que se vai encontrar e nunca se volta. Mas a morte não me mete medo. Há coisas bem piores que morte. Pior que morrer, é viver sozinho. Uma amiga minha escreveu um post onde falava de um casamento a que tinha ido assistir afirmando para trás ficava a insegurança dos jovens que não suportam a ideia de nunca encontrarem uma cara metade e de permanecerem na solidão para todo o sempre. Medo. Mas ao contrário do que é dito no Star Wars em que o medo leva à raiva, a raiva leva ao ódio e o ódio causa sofrimento, eu sinto angústia, ansiedade, incompreensão e confusão...
Perfiro olhar para o continente desconhecido da mesma forma que é visto no Star Trek: o futuro. E espero que não me traga nenhum sabor amargo. A minha amiga diz sempre gostei de acreditar que o amor é possível. Ele será aquilo que vocês quiserem, será o que fizerem por ele. Vejamos se ela tem razão. Alheamento, desprezo, indiferença, escolhas selectivas são atitudes monstruosas feitas por quem devia ter humildade sobre quem sempre foi humilde. E quando se têm atitudes monstruosas focadas no mesmo, ao fim dum tempo obtem-se... um monstro.
21:00. Acordo dos meus pensamentos e reparo que nada mudou à minha volta. Chegou o meu amigo Maurício que regressou de Madrid, até chegou o Paulo Portas a tentar passar despercebido com uns óculos escuros dentro do terminal... Ela ainda não saíu da zona de chegadas. Soube que ficou retida pelo SEF por um problema qualquer. Pior para ela que está a perder o seu tempo. Pior para mim que perdi o meu tempo e o meu jantar.